Atenciosamente, daquele que escreve às duas da manhã porque ainda está acostumado com o horário de Brasília.
Não queria cometer o clichê de dizer que os primeiros dias de meu intercâmbio têm sido intensos, mas nesse momento tenho condições de dizer como são. Em menos de uma semana, eu aprendi a desvendar esse precipício que me aguarda com possibilidades, oportunidades e inspirações. Já aprendi que nem todo caminho difícil é o pior, e que momentos turbulentos, tais como tempestades, lavam mais a alma do que qualquer simples e agradável garoa. É a intensidade que me fascina, que me atrai, que me inspira. É a coragem de se atirar à escuridão, e encontrar luz, luz e luz. É o viver, o despertar, o descobrir.
Não é exagero dizer que amadureci muito em pouco tempo. Desde antes da partida, na preparação para a viagem, já enfrentava a realidade de que teria de encarar tudo de cabeça erguida. E, para um garoto que nunca havia sequer embarcado num avião, aprendi a agir rápido e a encontrar soluções sensatas. A sensação de voar sob tudo era nova, assim como a de se deixar para trás sua comodidade e construir uma história em um novo lugar. Meu coração, porém, estava confortado.
A partir de agora, relatarei as situações que ocorreram comigo e com minha colega de projeto Hellen. Quando o voo de Rio de Janeiro para Zurique atrasou, já imaginávamos que perderíamos a conexão para o Porto. Não posso dizer que escondi bem o nervosismo, mas resolvi dormir para ver se esfriava a cabeça. Após longas e cansativas horas, chegamos à maior cidade suíça. Um dos momentos mais interessantes do voo foi quando atravessamos o deserto do Saara, entretanto, nenhum dos passageiros que viajava nas laterais se atreveu a dar mais que uma olhadela pela janela. Como previsto, a chegada em Porto teve de ser adiada. Felizmente, a companhia aérea providenciou boa hospedagem e alimentação. Aproveitando o descanso, conhecemos um pouco de Zurique, encantados com cada esquina, cada folha, cada painel de divulgação de filmes. Limitamo-nos à área ao redor do hotel, mas confesso que pudemos apreciar as construções com estilos que nunca fomos acostumados a ver.
Minha colega de projeto Hellen e eu chegamos no Porto no dia seguinte às 21h. Não tive uma primeira impressão da cidade, pois foi difícil enxergar algo pelo vidro do carro. Dona Amélia, a senhora querida que nos recebeu e nos transportou, havia comprado fiambre, pães e frutas para nossa primeira refeição em terras lusitanas. Tudo muito saboroso e novo, mesmo estranhando o fato de que os pães em Portugal são mais duros que os brasileiros.
No dia seguinte, Dona Amélia levou-nos conhecer o metrô e as linhas disponíveis. Como estudamos no ISEP, a senhora recomendou que tomássemos a linha amarela. Ficamos encantados com a boa localização do lugar, além do fato de que há um mercado próximo, assim como uma pastelaria.
Em algum dia da primeira semana, resolvemos conhecer a Ribeira. Nas margens do Rio Douro, as construções antigas pareciam mais uma galeria de história viva. Fiquei impressionado em cada esquina – para cada canto que olhava me surpreendia mais e mais. O número de estrangeiros também chamou-me a atenção. Americanos, franceses, indianos, brasileiros… Todos fascinados com um dos melhores destinos da Europa. Antes de regressarmos para casa, subimos o Mosteiro da Serra do Pilar. Apreciamos a vista e sentimos muita gratidão por estarmos ali. Naquele momento, tivemos noção de onde estávamos, do que faríamos e do horizonte que se abrira em nossas vidas.
Nosso primeiro dia no ISEP foi uma apresentação básica. Adentramos o Grupo de Reações e Análises Químicas e conhecemos a doutora Manuela. Inicialmente, ela apresentou-nos diversos laboratórios do GRAQ e deu-nos as primeiras orientações para o projeto. Achamos interessante a área de valorização de resíduo agro-alimentar que trabalharemos. Primeiramente, seremos auxiliados pela doutora Virgínia a avaliar a quantidade de pesticidas em galhos de macieira por cromatografia gasosa. Em seguida, voltaremos a trabalhar com a Doutora Manuela, investigando os benefícios e aplicações dos resíduos da poda de macieiras e videiras em novos subprodutos.
Em suma, adaptei-me bem à vida no Porto. Nessas duas primeiras semanas de adaptação recebi muito mais do que esperava. Vale ressaltar que tive um choque cultural muito maior com minha colega de projeto de Xanxerê do que com os portugueses (e olha que moramos no mesmo estado!). A maneira de falar, as expressões, as comidas típicas… Tudo tão diferente. Aprendizado constante, dentro e fora do nosso Brasil. Aprendi também coisas simples da vida que só absorvemos quando somos obrigados a nos tornarmos independentes em todos os sentidos. Aprendi a administrar dinheiro, preparar novas receitas, a pensar no almoço do dia seguinte, a ser o maior responsável por mim… Creio que absorverei muito mais desse fascinante local, que, muito mais do que boas fotos, rende momentos que não se registram em lugar algum além de nossas memórias.
Curiosidades:
As pessoas assoam o nariz aqui em qualquer lugar, com a maior força, sem vergonha. No Brasil isso seria constrangedor, aqui é algo natural.
O povo é muito simpático e educado! Por favor, com licença, obrigado.
E pastel de nata é uma delícia.